Imunoterapia antes e depois da cirurgia melhora desfechos no câncer de cabeça e pescoço localmente avançado, aponta estudo
- daniellezanandre
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Os resultados do estudo no câncer de cabeça e pescoço localmente avançado mostraram que a sobrevida livre de eventos em três anos foi de 59,8% no grupo pembrolizumabe, contra 45,9% no grupo controle, uma diferença estatisticamente significativa para os tumores com expressão elevada da proteína PD-L1 (CPS ≥ 10). Benefício semelhante foi observado também na população geral do estudo.

Durante décadas, o tratamento dos tumores de cabeça e pescoço localmente avançados manteve-se ancorado em cirurgia, radioterapia e, em casos selecionados, na quimioterapia com cisplatina. O estudo multicêntrico internacional Neoadjuvant and Adjuvant Pembrolizumab in Locally Advanced Head and Neck Cancer, publicado em junho de 2025 no The New England Journal of Medicine, aponta para a inclusão do imunoterápico pembrolizumabe antes e após a cirurgia como terapia que aumenta a sobrevida livre de eventos, sem comprometer a segurança ou a viabilidade do tratamento cirúrgico.
O ensaio clínico de fase 3 KEYNOTE-689 envolveu 714 pacientes com carcinoma epidermoide localmente avançado de cavidade oral, orofaringe, laringe ou hipofaringe. Metade dos participantes recebeu o padrão tradicional de tratamento e a outra grupo recebeu o mesmo protocolo associado a duas doses de pembrolizumabe em fase neoadjuvante e quinze doses adicionais após a cirurgia, de forma concomitante e adjuvante à radioterapia. A mediana de acompanhamento foi de 38 meses.
Os resultados mostraram que a sobrevida livre de eventos em três anos foi de 59,8% no grupo pembrolizumabe, contra 45,9% no grupo controle, uma diferença estatisticamente significativa para os tumores com expressão elevada da proteína PD-L1 (CPS ≥ 10). Benefício semelhante foi observado também na população geral do estudo. Na prática, isso significa que o uso perioperatório da imunoterapia reduziu o risco de recorrência, progressão ou morte em aproximadamente 30%.
Outro dado relevante é que o uso neoadjuvante do medicamento não atrasou nem reduziu o número de cirurgias realizadas. Cerca de 88% dos pacientes em ambos os grupos concluíram a ressecção do tumor no prazo estipulado. Em termos de segurança, os eventos adversos graves (grau 3 ou superior) ocorreram em proporção semelhante entre os grupos: 44,6% nos tratados com pembrolizumabe e 42,9% no grupo padrão.
Os autores também afirmam que as reações imunomediadas, esperadas nesse tipo de terapia, foram controláveis na maioria dos casos. Os autores destacam também que o benefício foi consistente nas diferentes faixas de expressão de PD-L1 e tipos de tumor primário. Além da melhora na sobrevida livre de eventos, o estudo identificou resposta patológica maior em 9,4% dos pacientes e resposta patológica completa em 3% dos tratados com pembrolizumabe — resultados considerados encorajadores, pois sugerem que parte das células tumorais foi eliminada ainda antes da cirurgia.
O cirurgião oncológico Dr. Luiz Paulo Kowalski, referência em tumores de cabeça e pescoço, explica que a pesquisa traz implicações importantes para a prática clínica. “O estudo reforça o papel da imunoterapia não apenas na doença metastática, mas também em estágios em que a doença localmente avançada é operável, quando ainda é possível planejar o tratamento com intenção curativa. O uso perioperatório do pembrolizumabe pode representar um avanço real para reduzir a recorrência local e à distância”, avalia.
O ensaio KEYNOTE-689 é o primeiro a demonstrar ganho significativo de sobrevida livre de eventos com imunoterapia associada ao tratamento cirúrgico nesse grupo de pacientes. Embora o acompanhamento para sobrevida global ainda esteja em andamento, os dados iniciais já sinalizam melhora de cerca de 9 pontos percentuais em três anos (68,4% versus 61,1%). Para especialistas, trata-se de um passo promissor em uma área que há décadas carecia de avanços expressivos.
O trabalho também demonstra que a estratégia de combinar imunoterapia antes e depois da cirurgia pode inaugurar uma nova era de tratamento personalizado também no câncer de cabeça e pescoço. “Cada vez mais, o tratamento oncológico caminha para integrar intervenções sistêmicas precoces com terapias locais, respeitando as características biológicas do tumor e do paciente”, afirma Kowalski. “Os resultados do KEYNOTE-689, conclui Kowalski, mostram que esse conceito é possível sem comprometer a segurança cirúrgica, o que abre uma perspectiva concreta de melhora da sobrevida e da qualidade de vida e já foi incluído nas diretrizes do NCCN (National Comprehensive Cancer Network dos Estados Unidos) para câncer de boca, orofaringe, laringe e hipofaringe localmente avançados.
Referência do estudo
Uppaluri R, Haddad RI, Tao Y, Le Tourneau C, Lee NY, Westra W, Chernock R, Tahara M, Harrington KJ, Klochikhin AL, Braña I, Vasconcelos Alves G, Hughes BGM, Oliva M, Pinto Figueiredo Lima I, Ueda T, Rutkowski T, Schroeder U, Mauz PS, Fuereder T, Laban S, Oridate N, Popovtzer A, Mach N, Korobko Y, Costa DA, Hooda-Nehra A, Rodriguez CP, Bell RB, Manschot C, Benjamin K, Gumuscu B, Adkins D; KEYNOTE-689 Investigators. Neoadjuvant and Adjuvant Pembrolizumab in Locally Advanced Head and Neck Cancer. N Engl J Med. 2025 Jul 3;393(1):37-50.
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